segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Para brisa

Depois de oito anos vivendo em SP, este foi o único ano que não entrei em uma sala de aula para estudar. Ainda assim, as pessoas, os abraços, as palavras e os saraus, que estiveram comigo nesse período, me apontaram ensinamentos que eu jamais poderei esquecer, lições para a vida inteira.
Houve momentos de desespero sim, muitas coisas deram errado no trabalho, projetos não puderam ser realizados, faltou grana, enfim, 2012 não foi fácil. A vida se impôs; mas dos fracassos, ficaram cicatrizes e o exercício de levantar-me.
Não vou retroceder, nem ficar medindo o tamanho dos sucessos e tombos desse ano. Venho aqui, nessas últimas horas de 2012, anunciar o lançamento do meu próximo livro: Para brisa e desejar que amanhã seja um dia melhor. Mas que também sejamos pessoas melhores nesse novo ano que chega. Que nossa arte siga na mesma direção e, ainda que distantes, estejamos unidos.
Que a vida seja justa com a nossa caminhada e não nos permita vacilar nem desistir, pois somos jovens, e apenas começamos.
Com todo coração,
Coragem!
(Tenda Literária - 01/09/2012)

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

A caminho


Eu queria janela, mas só tinha corredor. Tudo bem. Mais importante era viajar. A passagem custou-me 186,48 dinheiros, que consegui ao vender a roça de mandioca e minha bicicleta. Com a venda da farinha, mais a bezerra e uns rolos, juntei 150 dinheiros e me piquei pra São Paulo. Eu tava decidido a fazer Letras, custasse o que custasse; fosse lá o que Letras significasse.
Eu não tinha datas pra comemorar até o dia em que sentei na poltrona nº 32 da viação Gontijo. Do lado de fora do buzão, minha barreira (nome dado à galera, gangue, turma) gritava pequenas obscenidades, me dava tchau, me tirava o ar enquanto me dava forças. Naquele instante não suspeitei que lamentaria pelo resto da vida por tal erro: não ter dado um abraço em meus amigos. Um abraço. Baiano sabe chegar, não sabe se despedir, penso eu.
Aquilo era 17 de dezembro de 2004. Eis aqui o canhoto da passagem, que não me deixa mentir. É claro que a minha história não começou naquela tarde, na rodoviária de Acajutiba, com aquele povo reunido, tudo pronto pra dizer "Deus lhe abençoe!", "dê lembranças a Zé Carlos", "cuidado com as primas", "tem dez conto aí pra me emprestar?"... 
É certo que eu não nasci ali. Mas a partir daquele dia, comecei a sentir falta das coisas mais bestas, como pilotar carroça, brincar com sobrinhos, pegar um baba: casados contra solteiros, beber e pedalar, pedalar. Detalhe: depois dali, ninguém nunca mais me chamou por Nicolau, Nivaldinho, seu poeta, o fio da dona Maria... Por Ni ainda chamam, mas Ni é diferente, né? 
Depois de um dia e duas noites de viagem, desembarquei no Tietê com o coração todo nervoso. Lembro bem, gastei 30 dinheiros só com lanches no caminho. Eu tava traumatizado: "como pode um pão com carne custar 7 dinheiros?" No Barreiro, o cara tinha que trabalhar 9 horas embaixo dum sol lascado pra ganhar 10 contos... "Como pode?"
Minha roupa caberia numas duas sacolas dessas de mercado, mas como é de conhecimento de todo vivente, retirante é mula: transporta tapioca, farinha, doce de leite, jaca, bala, carne de bode e tudo mais que seja removível e não supere a cota de 30 quilos estabelecida pelas empresas de ônibus. Em outras palavras, cheguei carregado de beregats (nome dado às tranqueiras, muambas). Tudo bem. Mais importante era viajar.
Era 7 da manhã e eu já tava andando pelas ruas de São Paulo. Vi duas meninas de cabelos coloridos num ponto de ônibus em Moema. "São punks", alguém disse. "Quer dizer que isso é que é ser punk?", pensei. "Decente!", concluí.
No trajeto Terminal Tietê-Cocaia, vi um prédio feito todo de vidro (como pode?), uns caras com as calças lá em baixo e um monte de coisa doida. Eu tava todo bestão.
Era domingo, comi biscoito com coca-cola no almoço. Na MTV passava o clip "Hey Ya", do Outkast, na Globo passava anúncio do "Meu tio matou um cara" e, no meu coração, tudo ficava; Passei os meses seguintes com três pensamentos no lugar das ideias: como fazer pra fazer Letras; como será que tá minha barreira; como é que pode...
Enquanto o tempo fazia o papel dele, fiz o que sei. Estudei e concluí o curso de Letras em dezembro de 2008; Vi minha filha nascer em março de 2011; Escrevi e em novembro de 2011 lancei meu primeiro livro. Sim, hoje eu tenho datas para comemorar. 
Essa semana completou 8 anos que cheguei aqui em São Paulo. Nem tudo foi flores. Existe ainda saudades, fracassos, perdas, separações, apertos e perigos a superar. Mas existe também vontade, amor e coragem. Existe minha barreira. 
Tou a caminho. Não cheguei lá, nem descobri onde fica esse lugar (lá). Sei que mais importante é viajar. 
Uma vez perdida, toda força será encontrada.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Tão bom quanto estar lá, é ser lembrado

Meu gol de placa não é ver seu livro na lista dos mais vendidos. Ser lido. Eis minha apoteose. Toda vez que ouço uma opinião sobre algo que escrevo ou uma poesia que recito, me sinto meio Pelé, honrado e feliz. Dá uma alegria danada saber que existem pesssoas utilizando meus textos em sala de aula, citando minhas ideias nos saraus, em teses, artigos e músicas.

(Sarau Pensamento Negro - Embu Guaçu)
Ontem li um artigo em espanhol no qual a autora Fernanda Matos fala com propriedade sobre Literatura Marginal, contextualiza os saraus realizados nas periferias paulistanas e cita o Tratado sobre o coração das coisas ditas. Sensacional. Segue trecho abaixo:
"en una mezcla de géneros cortos como la crónicas y la poesía, trata de temas que van más allá de retratar espacios marginales y problematizan cuestiones inherentes al ser humano como las planificaciones para el futuro, el lidiar constante con la insatisfacción por la vida, consigo mismo, con los problemas sociales, abarcando hechos que marcan profundamente el hombre como el nacimiento de un hijo o la ruptura de una relación amorosa. En un texto suyo el autor opina sobre la crítica literaria y levanta cuestiones interesantes sobre los procesos que legitiman o no una obra, es decir, de qué campo cultural e ideológico apropiándose términos bourdieanos, se clasifica, se da valor y si realmente el que critica sabe criticar o mejor como en la analogía que hace si aquel que degusta sabe cocinar..."
Estudante da Universidade do Chile, Matos faz referência a alguns dos nossos autores e discorre coerentemente sobre a cena literária marginal. Para ler o artigo inteiro, clique em La élite tiembla – literatura marginal como instrumento de transformación social.
Hoje também tive meu trabalho citado na matéria "Gente de Talento", da jornalista mineira Ana Márcia  de Lima. Meu coração ainda está rindo com esse reconhecimento e carinho. Leia: Diálogo Invisível.
Coragem!

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

2ª impressão esgotada

A segunda impressão do Tratado acabou. Não foi nada fácil, mas seria praticamente impossível chegar até aqui se não tivesse contado com a ajuda e fé de tantos amigos.
Ao todo, foram 500 exemplares distribuídos mão-a-mão nos saraus e festivais de música.
Como toda obra independente que se preze, aqui não teve jabá. A única propaganda utilizada foi o boca-a-boca, o depoimento sincero dos amigos que leram o Tratado e foram indicando, passando a ideia adiante.
Essa caminhada foi um aprendizado muito importante pra mim; Com certeza saio mais forte e maduro dela. Meu coração está cheio de alegria e ânimo para enfrentar novos desafios; sinto que esse livro cumpriu sua parte, foi lido, criticado, elogiado e comentado por pessoas de valor.
Agradeço a todos os espaços-terreiros que abriram suas portas com tanto carinho e respeito para que eu pudesse apresentar o meu filho. 
Um salve aos parceiros do sarau Suburbano Convicto, Cooperifa, Litera Rua, Ecla Toca do Saci, Biblioteca Adelpha Figueiredo, Encontro de Utopias, Casa Fora do Eixo e Encontro Rap. 
Tenho consciência de que esse livro não pertence (acho que nunca pertenceu) só a mim. Desde o começo fiz questão de envolver pessoas, estive aberto para ver e incluir outras linguagens que pudessem dialogar e enriquecer meus textos. Acho que isso trouxe mais significado e vida à obra.
Amigos-leitores, muito obrigado, de todo coração. Espero que tenham gostado desse meu primeiro livro; Fiquem a vontade para comentar, sugerir e criticar. Afinal, só quem leu o Tratado tem moral para fazer isso. 
Coragem!

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sarau Suburbano Convicto

Difícil falar dos últimos acontecimentos sem recorrer às hipérboles, superlativos ou outros artifícios de exagero. Estes são dias de sentidos e sentimentos à flor da pele. Ainda bem que sou poeta, não jornalista. Antes dos fatos, meu compromisso é com o não-visto, com as outras versões não identificadas.
 
A algum tempo minhas terças e quartas-feiras são sagradas. Nestes  dias vou aos saraus Suburbano Convicto e Cooperifa, respectivamente, aprender novos mitos, viver outros sonhos e descobrir novos heróis.
Ainda que irmãos, cada sarau possui sua própria mística, energia e identidade. Os saraus não se repetem.
Na última terça celebramos o 40º aniversário do Alessandro Buzo, o criador do Suburbano Convicto. A festa foi um sarau. E vice-versa.
Como se não bastasse, houve lançamento do livro "Deus foi almoçar", do Ferréz, samba do "Comunidade da Santa" e os poetas, em pleno Bixiga, soltando rajadas de palavras certeiras.
Voltei pra casa em estado de graça. Fui dormir rindo, feliz por contar com amigos verdadeiros ao meu lado. Acordei com a convicção de que estou vivendo os melhores dias de minha vida.

Ao Buzo, vida longa! Muito obrigado pelo carinho e atenção. Além do artista, admiro o homem que você é. Através da sua caminhada, você tem feito muita gente voltar a acreditar na possibilidade de um mundo mais bonito, justo e melhor. Parabéns!
Próxima terça-feira tem mais sarau Suburbano Convicto. E eu estarei lá!

Conheço meu lugar - Belchior