sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sarau Suburbano Convicto

Difícil falar dos últimos acontecimentos sem recorrer às hipérboles, superlativos ou outros artifícios de exagero. Estes são dias de sentidos e sentimentos à flor da pele. Ainda bem que sou poeta, não jornalista. Antes dos fatos, meu compromisso é com o não-visto, com as outras versões não identificadas.
 
A algum tempo minhas terças e quartas-feiras são sagradas. Nestes  dias vou aos saraus Suburbano Convicto e Cooperifa, respectivamente, aprender novos mitos, viver outros sonhos e descobrir novos heróis.
Ainda que irmãos, cada sarau possui sua própria mística, energia e identidade. Os saraus não se repetem.
Na última terça celebramos o 40º aniversário do Alessandro Buzo, o criador do Suburbano Convicto. A festa foi um sarau. E vice-versa.
Como se não bastasse, houve lançamento do livro "Deus foi almoçar", do Ferréz, samba do "Comunidade da Santa" e os poetas, em pleno Bixiga, soltando rajadas de palavras certeiras.
Voltei pra casa em estado de graça. Fui dormir rindo, feliz por contar com amigos verdadeiros ao meu lado. Acordei com a convicção de que estou vivendo os melhores dias de minha vida.

Ao Buzo, vida longa! Muito obrigado pelo carinho e atenção. Além do artista, admiro o homem que você é. Através da sua caminhada, você tem feito muita gente voltar a acreditar na possibilidade de um mundo mais bonito, justo e melhor. Parabéns!
Próxima terça-feira tem mais sarau Suburbano Convicto. E eu estarei lá!

Conheço meu lugar - Belchior

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Amizade*

São Paulo, 17 de dezembro de 2010
Flora, coragem!
Ontem o Romário foi demitido da empresa. Aqui, ele era meu único amigo. Antes dele chegar, era eu o “Bahia”, mas depois ficou sendo ele.
Gostava de conversar com o Romário porque a gente se entendia bem; bastava um olhar pro outro e dizer: eta pleura; da gota; vixi, cabrunco. Era decente!
Sabe, quase todo dia ele me mostrava aquele retrato no Ibirapuera com a mulher e suas duas filhinhas na garupa daquela bicicleta azul. Os olhos do Romário – assim como o de todas as pessoas - tinham estrelas, mas toda vez que falava da família e dos planos de voltar pra casa, os olhos dele se enchiam de constelações. E eu achava bonito escutar seus sonhos, podia medir o universo em suas palavras.
Pelo menos pude abraçá-lo antes que ele fosse embora. Sentirei falta, e é ruim pensar que não nos veremos mais... Sei lá. Pior deve ser não ter de quem sentir saudade, não ter de quem lembrar, não sentir.
Filha, queria ter dito que sentia mor orgulho de tê-lo como amigo e que era pra ele não ficar triste, nem desanimar, porque merecia coisa melhor que isso aqui. Enfim... mas talvez ele nem acreditasse. Achasse que eu só tivesse querendo fazer média ou tentando consolá-lo... essas coisas. Mas é verdade, eu admiro cada um dos meus amigos; todo retirante é meu conterrâneo.
Acho que ainda essa semana vão colocar outra pessoa para fazer o mesmo trabalho que ele fazia aqui. Afinal, tem sempre um “Bahia” procurando emprego. Ontem voltei pra casa pensando como vai ser o Natal do Romário. Pensando se vai ter “Papai Noel” pra trazer presente pras filhinhas dele. Porque é só chegar novembro e já tem Papai Noel na cidade toda. Até no ônibus tem. Não é certo que falte logo na casa do Romário, logo agora. Não quero te desanimar, mas Papai Noel não é um cara legal.
Filha, você deve estar se perguntando porque estou lhe falando essas coisas. Pois bem. Ninguém jamais escreveu sobre o Romário, sobre um pião, um desempregado. E escrevo isso porque talvez ninguém diga que o meu amigo vai fazer falta, que ele não pode ser substituído só porque existe outra pessoa que sabe apertar os mesmos botões, que sabe repetir os mesmos gestos de máquina.
Lhe contei essa história porque você precisa saber que eram “Bahias” os homens e mulheres assassinados na Candelária, Nagasaki, Hiroshima, Jerusalém e, dia desses, aqui perto de casa. Também foram os “Bahias” que inventaram a ginga, o groove, as greves, as guitarras. Não criamos a guerra. Nós somos o revide!
Woodstock, a Tropicália, o Pasquim, o Manguebeat: tudo movimento de “Bahias”. Garrincha, Elis, Chaplin, Dercy Gonçalves, João do Pulo, Bruce Lee, Jesse Owens, Lima Barreto... nenhum deles era baiano; eram todos “Bahias”.
Os livros de história não falam da gente; ninguém quer registrar nos filmes nem nas fotografias a grandeza do meu amigo. Mas ele existe. E é por isso que tou lhe escrevendo agora. Para que saiba que é bom conhecer e ter orgulho das pessoas, não porque elas são bem sucedidas, mais inteligentes ou chamam a atenção das outras. É bom gostar dos amigos exatamente pelo que eles são: humanos, amigos.
Flora, defenda com honestidade os seus sonhos. Que nunca falte sol em seu coração e amor para fazer acender constelações em seus olhos. Porque tanto faz ser um Bahia ou o filho do rei, sem luz nem amor, a gente é nada.
Com todo coração,
do seu pai, Ni.

[Da coleção Cartas a Flora, Ni Brisant]

domingo, 23 de setembro de 2012

'Um Poema em Cada Árvore' - minha poesia esteve lá

Mesmo sem chegar onde ia, minha missão vai ainda mais longe. Eis a tônica desses dias. 
(Um Poema em Cada Árvore, Uberaba-MG)
Na última sexta-feira (21/09) o poema Sobrenome Liberdade foi selecionado para participar do projeto Um poema em cada árvore, em Uberaba/MG.  
Em comemoração ao dia da árvore, o projeto consiste em pendurar poemas de autores desconhecidos em árvores de praças públicas para apreciação e acesso gratuito à leitura e arte. 
Além de aumentar o índice de leitores, abre espaço para a divulgação da produção literária de escritores desconhecidos do grande público e valoriza a poesia de um grande público.
(Uma árvore e um poema, são dois poemas")
Essa iniciativa aconteceu simultaneamente em cerca de 80 cidades, onde todas as poesias foram devidamente embaladas e amarradas às árvores com barbante de algodão.

Fonte: G1

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

De olho no Futuro

Dia desses fui convidado a dar uma palestra sobre o ofício de escrever, falar do meu livro, dos desafios da carreira, remuneração (como?), enfim, essas coisas da profissão. Essa palestra aconteceu no último dia 31 na matriz do ESPRO (Ensino Social Profissionalizante) e fazia parte do De olho no futuro, programa destinado a jovens aprendizes.
Foi interessante compartilhar um pouco da minha experiência, dividir conhecimento e falar dos desafios e alegrias dessa profissão problema.
É concebível que alguém pinte telas admiravelmente, ainda que nunca tenha ido a um museu. O mesmo em relação a um ator, músico, dançarino... Mas quanto a um escritor? A escrita é dom, esforço ou estudo? Alguém que nunca leu um livro é capaz de produzir uma obra literária de respeito?
Foi a partir dessas provocações que iniciei a conversa. Bacana ver o interesse, contar com a interação para discutir alguns clichês literários e constatar que a maioria deles lêem regularmente.
Assim como a maior parte dos escritores contemporâneos (periféricos ou não), estou muito distante de viver da escrita, enfrento vários obstáculos para publicar meus textos e não me enquadro no rótulo de CDF. Eis um paradigma quebrado.
É bom ler os best sellers, mas também é legal conhecer os autores divergentes, anônimos, marginais; aqueles que não aparecem na lista dos mais vendidos, mas escrevem tão bem quanto... Fiz questão de deixar isso claro. Mostrar que a escrita é, de certo modo, um ato de subversão da ordem.
Cada pessoa tem uma maneira própria de expressar suas ideias, sonhos e sentimentos. Daí a importância de ler tudo e todos. Daí a vantagem de não nos prendermos a apenas um estilo literário, a apenas uma versão dos fatos, um tipo de filme e tal.
Gostei muito de participar dessa iniciativa, de dar meu testemunho e falar sobre a necessidade de defendermos nossos sonhos, nossas utopias.
Acredito que ler liberta, escrever também; a beleza também está nos olhos de quem vê. Por isso sugeri que escrevêssemos um poema coletivo. Saquei meu relógio de bolso e perguntei o que eles viam ali, quis saber os possíveis significados daquele objeto. Eles me deram segredos, oportunidades, vida, liberdade, futuro e tantas outras palavras lindas... Que ironia! Por falta de tempo não consegui passar o texto a limpo durante a palestra. Mas valeu!
Dias depois recebi um e-mail da aluna Aline Oliveira de Souza contendo um poema com aquelas palavras chaves... Aquele e-mail salvou o meu dia. Meu ânimo e fé estão renovados.
Boa leitura.
 
TEMPO*
(por Aline Oliveira de Souza)
Fechar os olhos;
abrir os olhos.
Vejo a liberdade diante de mim,
a oportunidade me chama.
A vida é um instante que não podemos controlar.
Hoje escolho o futuro.
Abre-se como uma vontade de vencer,
a união que nos acorrenta nos liberta;
e nos permite dar mais um passo.
Não vejo o tempo.
lembranças o cercam de segredos.
Nem sempre enxergo no momento que ocorrem,
mas marcam e levamos nos detalhes de quem nos tornamos.
Tempo,
parece pequeno se vermos apenas a palavra,
pra mim infinito e eterno.
Tempo,
como o relógio pequeno que carrego no bolso
como se o controlasse,
mas que apenas aprendo a acompanhar!

domingo, 16 de setembro de 2012

A primavera prevalece

Seja no asfalto, no lixão ou na merda, as flores não pararam de nascer. Passem longe, fascistas incendiários de favelas!
Uma flor nasceu. Seu Sobrenome é Liberdade. A primavera prevalece.
 
Tenho ido a saraus, conversado com pessoas, tomado parte em novas lutas, sorrido boas alegrias. Não tem sobrado tempo para registrar aqui tudo que tem acontecido, tudo que tem se passado em meu coração. Mas entre a agitação dos eventos culturais e fadiga do trabalho, no último dia 13 celebramos o 1º Festival Sobrenome Liberdade. O Evento fez jus ao nome, foi um genuíno festival poético. Foi lindo!
Conforme prometido, a noite teve muita poesia, música e arte. Contando com a apresentação de 26 poetas (alguns vindos de outras cidades), exposição fotográfia de Toni Miotto e pocket show da Couro Cabeludo Rock, o festival me deixou em estado de alumbramento. Com o apoio dos poetas, dia 04 de outubro ocorrerá uma nova edição. Aliás, agora o Sobrenome ocorrerá toda quinta-feira do mês no Relicário Rock Bar. E você já está convidado. Prepare a sua arte!
Confira a matéria sobre o Festival publicada no Periferia em Movimento clicando em: Nasce um Sarau na Periferia de São Paulo.
O que aconteceu no Festival não pode ser descrito num relatório, não cabe em notícias de jornal; nem no meu coração cabe... Não há fatos a serem contados. Só poesia e arte. Aliás, toda poesia e arte.
Agradeço a cada um que compareceu ao Festival e ajudou a fortalecer mais esse reduto de resistência.
Uma flor nasceu. Seu Sobrenome é Liberdade. A primavera prevalece.
Veja as fotos do Festival feitas por Toni Miotto em: Imagens das poesias.
Coragem!
Algumas fotos abaixo.